Ana Eugênia Nunes de Andrade
Este trabalho tem por objetivo central analisar as capas da revista Veja durante as eleições presidenciais de 2002 trazendo temas polêmicos do cenário político nacional e compreendendo através dos signos a relação do verbal e do não-verbal, que possibilitam infindáveis leituras nas diferentes linguagens.
Na relação triádica signo, objeto e interpretante podemos compreender o mundo como linguagem para isso recorreremos às três categorias fundantes da semiótica de Peirce: primeiridade, secundidade e terceiridade na análise das capas da Revista Veja durante as eleições presidenciais de 2002. Pierce define signo como:
Um signo ou represêntamen é um primeiro que se coloca numa relação triádica genuína tal como um segundo, denominado seu objeto, que é capaz de determinar um terceiro, denominado interpretante, que assume a mesma relação triádica com seu objeto na qual ele próprio está em relação com o mesmo objeto[i] (Peirce, 1977.p. 63).
A linguagem da fotografia apresenta-se como uma trama sígnica. Ancorada na secundidade o referencial é visível de tal modo que parece ser real, a fotografia é um exemplo de um signo da secundidade, enquanto forma visual que insiste, resiste, ela pode cambiar entre primeiridade que se refere aos elementos básicos e essenciais como cores, formas, volume, textura e na categoria terceiridade que está representado naquilo que não está visível, mas que está sujeito a interpretações.
Para Santaella o interpretante “é o efeito provocado numa mente e nele se completa a operação do signo. Nenhum signo fala por mesmo, mas exclusivamente outro signo. Assim sendo, não há nenhum modo de se entender o signo, a não ser pelo seu interpretante[ii]”. (Santaella, 1995, p.88).
Nas eleições presidenciais de 2002 ocorrem deslizamentos de sentidos no campo publicitário, o slogan Lula Lá usado em 1989 dá lugar ao Lula Paz e Amor. Para Barthes (1969:7-8), toda imagem é polissêmica por implicar uma “cadeia flutuante” de significados subjacente a seus significantes, podendo o receptor/leitor escolher alguns significados em detrimento de outros. A mensagem lingüística é uma dessas maneiras de se pinçar significados dessa cadeia flutuante: “o texto dirige o leitor através do significado da imagem e o leva a considerar alguns deles e a deixar de lado outros. (...) A imagem dirige o leitor a um significado escolhido antecipadamente[iii]” (apud Santaella & Nöth 1998: 55). A essa função de dirigir ou orientar o leitor na escolha de significados, Barthes dá o nome de ancoragem. Em todos os casos de ancoragem, avisa o autor, a linguagem verbal tem função de elucidar, mas essa elucidação é seletiva e, portanto, ideológica.
A imagem do ex-metalúrgico que em disputas anteriores parafraseava o pensamento do operariado brasileiro com a assertiva Trabalhador vota em trabalhador foi intencionalmente alterada com o intuito de vencer o medo do eleitorado. O Partido dos Trabalhadores recorre ao publicitário Duda Mendonça para potencializar o marketing político que busca uma estratégia de política moderada desconstruindo a imagem de um partido político dogmático, radical e intransigente, com isso as alas mais radicais desligam-se do partido. Na capa da Revista Veja de 04/07/2001 podemos perceber a reconstrução da imagem do candidato Lula que aparece como um político sério, humano e sensível, a cor terra como plano de fundo da imagem nos remete a realidade, aos pés no chão. Os tons escuros da roupa, a barba aparada, o olhar sereno do candidato reforçam a ideia de seriedade. A manchete da capa Lula Light reforça as mudanças do líder petista. Em contrapartida, na chamada da capa: “Na tentativa de parecer simpático e escapar da quarta derrota, o candidato do PT fala agora em fazer alianças amplas e em defender a estabilidade da moeda”, notamos que o texto apresentado coloca em dúvida o discurso do candidato podemos perceber a ambigüidade nas inscrições verbais: tentativa, escapar e fala agora. O logotipo Veja em vermelho faz uma associação da cor original do Partido dos Trabalhadores que tem na sua historicidade uma ideologia de esquerda.
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Revista Veja – 04/07/2001 |
Na edição abaixo de 25/09/2002 o logotipo se apresenta na cor amarela que simboliza no imaginário coletivo a ideia de atenção, cuidado, fique atento. Podemos notar que ao fundo aparece o céu da capital republicana coberto por nuvens, sugerindo assim um tempo de incertezas. A estrela vermelha, símbolo máximo do Partido dos Trabalhadores, com a faixa presidencial verde e amarela, está acima do Congresso Nacional, solitária e sem sustentação, solta nos ares brasilianos. No canto superior esquerdo, uma tarja azul escuro que nos remete ao luto traz as inscrições verbais: José Dirceu, em amarelo, o que remete o leitor a um sinal de atenção e em letras maiúsculas: O HOMEM QUE FAZ A CABEÇA DO PRESIDENTE, a expressão reforça a ideia de que o candidato petista é despreparado para assumir o cargo, Lula precisa de alguém que pense por ele. Por fim a manchete da revista em branco como as nuvens traz a seguinte pergunta em letras maiúsculas: O PT ESTÁ PREPARADO PARA ASSUMIR A PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA?
Revista Veja – 25/09/2002 |
Observamos na imagem abaixo que na última semana antes das eleições do segundo turno, no dia 23/10/2002 a revista Veja estampou na capa uma figura monstruosa de um animal com três cabeças e o rabo vermelho do diabo com três nomes importantes do Partido Comunista da União Soviética Marx, Trotsky e Lênin transfigurados pela raiva. O título da revista trabalhava com o medo do PT: “O que querem os radicais do PT” e com a chamada: “Entre os petistas, 30% são alas de revolucionários. Ficaram silenciosos durante a campanha. Se Lula ganhar, vão cobrar a fatura. O PT diz que não paga”. A revista insinua que existe dentro do partido um grupo de radicais que não darão sossego ao governo de Lula, caso ela vença, o perigo se faz presente. No canto superior esquerdo, espaço de grande visibilidade o revista traz uma tarja em vermelho com os enunciados Brasil em amarelo, O risco de um calote em branco. Por fim, a capa com o fundo azul mostra a dualidade céu x inverno, ou seja, o perigo vermelho ronda o Brasil, a expressão: fiquem atentos está reforçada no amarelo do logotipo.
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Revista Veja - 23/10/2002 |
Agora analisaremos a edição de 30 de outubro de 2002, intitulada TRIUNFO HISTÓRICO, podemos notar o predomínio da cor azul no plano de fundo, no logotipo e na bandeira nacional em tonalidades diferentes, Lula sorridente de terno e gravata segura o maior símbolo republicano, sendo que a palavra progresso aparece em destaque na imagem. A revista faz questão de ressaltar em amarelo que presidente eleito é de origem popular, o ex-metalúrgico do ABC Paulista, filho de retirantes nordestinos chega a Presidência da República e na chamada mostra os desafios que deverão ser vencidos. Além de ressaltar as conquistas do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso governou o país por oito anos. Na capa há um predomínio das cores do PSDB azul e o amarelo, uma alusão aos méritos tucanos.
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Revista Veja – 30/10/2002 |